Clássico contemporâneo. É este o lema de José Avillez para a sua nova etapa no Belcanto. Algo que expressa na perfeição a sua actual cozinha e o seu novo restaurante.
Desassossego.
Couvert. De manteigas, fumada com flor de sal, de nozes e tradicional dos Açores. E de pães de fabrico próprio, de azeitonas, baguete, com sementes de papoila e mais que não provei.
Trio de azeitonas. Uma preta em tempura, outra verde esferificada e uma liquida num dry martini invertido.
Ainda nos amouses, Grão com Bacalhau. O tradicional sabor deste prato, numa crocante desconstrução.
Cavala Fumada com Confetis. Até aqui era maltratada e ignorada, hoje em dia não há quem se atreva a não a chamar aos seus menus. Impecável o peixe, sabor intenso, fresco, complementado por um suave creme de pinhões. Envinagradas rodelas de vegetais interpretam os confetis.Um prato bonito, a piscar o olho à nova tendência naturalista.
No Bosque Depois da Caça. Vem-me à ideia um dos mandamentos de José Avillez, "no prato tudo tem razão de ser...". Um prato com imensos elementos diferentes (que não consigo enumerar), onde pontifica um magnifico escabeche de perdiz, coadjuvado pelo foie gras e por um creme de perdiz. Aqueles pauzinhos na vertical, são uns finos grissinis com alecrim , a fazerem lembrar uma saudosa Fogueira (de salmonete, na altura). O nome não poderia descrever melhor os sabores deste prato. Vitorioso. O meu favorito.
A Horta da Galinha dos Ovos de Ouro. Um (já) clássico de José Avillez aqui recuperado para o menu do Belcanto. O ovo a baixa temperatura, a folha de ouro, os cogumelos, o creme de aves, o puré de castanhas, o crocante do pão, todos unidos para nos enlouquecerem. Daqueles pratos que nos ficam gravados para sempre.
O Salmonete a baixa temperatura, o Puré de Batata Doce e o Topinambo, tudo enobrecido pela frescura de uma alga e por um delicioso e comovente molho de fígados do peixe (a foto não ajuda, o molho está do lado contrário). A forma como o salmonete lasca, mal lhe tocamos com a faca, diz tudo sobre a reconhecida aptidão do Chef para trabalhar este peixe. Aqui mantém-se a fasquia nos píncaros.
Lombinho de Cordeiro. A carne estava tenra, num ponto de cozedura a gosto, com o cremoso molho a dar-lhe um agradável travo acídulo, mas como sempre os pratos de carne são os que menos me entusiasmam nestas ocasiões. O problema não é do menu, é meu. Reteve-se o engraçado pormenor da Laguiole.
Pré sobremesa. Framboesa com Wasabi. Simples, bonita e eficaz. A framboesa vem cristalizada, mas fresca, sem o excesso de doce. O wasabi só parece estranho até se fundir com a fruta, a partir daí passa a indispensável.
Tangerina. É de formas e temperaturas que se trata, dizem-nos. Uma sobremesa que nos prende pelo olhar e que se nos insinua a desconstrui-la cuidadosamente. A tangerina representada em várias formas e temperaturas, desde a grande esfera laranja que se parte com o garfo soltando o fresco creme do seu interior, até ao pedaço de fruta no seu estado mais puro. De novo a técnica em patamar altíssimo, sem nunca por o sabor em causa.
Expectativas ao alto para o regresso aos palcos de José Avillez. Ajudado pelos suspeitos do costume, ele corresponde. Exibição de monta, cheia de inspiração, publico satisfeito. Bis, bis, bis...
Almoço de semana, meia casa, ambiente tranquilo, interior remodelado. O tal clássico contemporâneo, na cozinha, mas também no ambiente e na decoração.
Serviço aprumado, simpático, dinâmico, profissional, nem sempre com a resposta na ponta da língua. Não é fácil quando se servem pratos com mais de 15 elementos. Muito bem.
Vinhos bem tratados, carta coesa, preços honestos para o espaço. Copos Schott, temperaturas no limiar da perfeição.
Ficámos a copo, nas mãos do escanção de serviço. Até ao bosque, o Lavradores de Feitoria Branco 2010 tomou conta do caso, depois chamou-se um Visconde de Salréu Branco 2005 para adornar a perdiz, e para terminar o acto, vieram as tintas Paisagens (2007) de José Avillez, interpretadas pela Quinta do Monte de Oiro. Boas escolhas, económicas conforme solicitado, que cumpriram e ajudaram o menu. Nota alta.
Está de regresso o bom velho José Avillez, para bem dos nossos pecados. Continua a contar-nos histórias, apesar de menos exuberantes que em período Tavariano. O molecular aparece agora mais recatado, menos delirante, entramos em nova etapa.
O nível é altíssimo, a trazer de novo a Lisboa uma cozinha ímpar e imperdível.
BELCANTOLargo de São Carlos, 10
1200-410 Lisboa
Tel: + 351 21 342 06 07
Horário:
Almoço: De terça a sábado das 12h30 às 15h00
Jantar: De terça a sábado das 19h30 às 23h00
Fecha ao domingo e segunda.
Preço médio: 55€. Menu Degustação: 75€Marcadores: Lisboa, Restaurante